A Sexta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), por maioria, decidiu manter a ação penal ajuizada contra o ex-senador Demóstenes Torres. O colegiado deu continuidade, na tarde desta terça-feira (17), ao julgamento do habeas corpus impetrado pela defesa de Demóstenes, que buscava o trancamento de ação penal que tramita contra ele no Tribunal de Justiça de Goiás (TJGO).
Iniciado no último dia 25 de agosto, o julgamento foi interrompido pelo pedido de vista do ministro Rogerio Schietti Cruz. O relator, ministro Sebastião Reis Júnior, havia concedido a ordem para reconhecer a ilicitude das provas obtidas (interceptações telefônicas) contra o ex-senador nas operações policiais Vegas e Monte Carlo.
Para Sebastião Reis Junior, embora Demóstenes Torres não figurasse como investigado nas operações da Polícia Federal, foram produzidas provas contra ele durante as investigações sem a devida autorização do Supremo Tribunal Federal (STF). Na condição de parlamentar, Demóstenes tinha foro por prerrogativa de função no STF, ao qual caberia decidir sobre a abertura de procedimento investigatório.
Cautela
Em seu voto-vista, o ministro Schietti entendeu que houve cautela dos juízes que atuaram no processo tão logo perceberam a existência de conversas entre os investigados na operação e o ex-senador.
“Um deles determinou o descarte do material, em relação à operação Vegas. O outro impôs, nos autos da Operação Monte Carlo, a sua autuação separada, a pedido do próprio Ministério Público Federal, baseado na inexistência de relação de tais conversas com o objeto da investigação e no risco de efetivo prejuízo ao sigilo e à efetividade da própria investigação desencadeada”, explicou o ministro.
Schietti destacou ainda que foi determinada na operação Monte Carlo a suspensão da investigação para que a autoridade policial, responsável pelas investigações, elaborasse um relatório de inteligência a respeito dos eventos potencialmente criminosos envolvendo agentes políticos com foro por prerrogativa de função e ainda, por cautela, suspendeu a cautelar de interceptação telefônica.
Entendimento contrário
Para a defesa, houve uma “investigação paralela” contra Demóstenes, com a intenção de burlar a competência do STF e a prerrogativa processual do então senador. Para Schietti, entretanto, as provas dos autos levam a entendimento contrário.
“A prudência para formação de juízo concreto acerca da possível imputação de fato criminoso a tão ilustre figura pública, bem assim, por outra angulação, a necessidade de não pôr a perder meses de intensa e ousada investigação, voltada a desbaratar complexa e alastrada organização criminosa relacionada à exploração de jogos de azar, prestigia o próprio interesse público que dá sustentação à necessidade de continuidade das investigações, preservando-se, a seu turno, a prerrogativa e os direitos da referida autoridade”, disse.
Outro ponto combatido foi a demora da remessa das investigações ao STF após a constatação do nome de Demóstenes no material coletado. Mais uma vez, o ministro Schietti rechaçou a argumentação. Segundo ele, a ausência da remessa imediata se justificaria tanto pelo volume de material colhido como pelo bom andamento da investigação.
Jurisprudência
Segundo Schietti, não tem sido hábito extrair conclusões tão rígidas de atrasos de atos processuais expressamente previstos em lei, inclusive aqueles para os quais se preveem prazos para sua prática.
“Ao contrário, até mesmo quando há desrespeito aos prazos procedimentais, em processos envolvendo réus presos, é consolidado o entendimento jurisprudencial no sentido de não ser reconhecido o constrangimento ilegal, ante critérios de razoabilidade, sobretudo quando se cuida de processos ou investigações – como, ineludivelmente, se verifica na espécie – com particular complexidade, envolvendo vários réus ou investigados”, explicou o ministro.
Schietti destacou ainda que nem mesmo a referência a favores pessoais, a contatos com terceiros, a negociações suspeitas implica, de per si, a inarredável conclusão de que se está diante de práticas criminosas merecedoras de imediata apuração, notadamente quando um dos interlocutores, por hipótese, integra um dos poderes da República e que, portanto, pode ter sua honorabilidade e imagem pública manchadas pela simples notícia de que está sob investigação.
“É dizer, aquilo que se imagina ser uma prerrogativa e uma proteção ao agente político pode, a depender da situação, consubstanciar precipitada conclusão tendenciosa e nefasta ao patrimônio moral da autoridade. Dito de modo mais específico, a simples captação de diálogos de quem detém foro especial, com alguém que está sendo investigado por práticas ilícitas, não pode conduzir, tão logo surjam conversas suspeitas, à conclusão de que tal autoridade é participante da atividade criminosa investigada ou de outro delito qualquer, sendo mister um mínimo de avaliação quanto à idoneidade e à suficiência de dados para desencadear o procedimento esperado da autoridade judiciária responsável pela investigação”, disse o ministro.
Por não identificar prática que configurasse constrangimento ilegal em relação ao ex-senador, Schietti votou pelo não conhecimento do habeas corpus, preservando, assim, a ação penal contra Demóstenes Torres.
Os ministros Maria Thereza de Assis Moura e Nefi Cordeiro e o desembargador convocado Ericsson Maranho acompanharam a divergência. Dessa forma, o ministro Schietti lavrará o acórdão.
Confira inteiro teor do voto aqui.
Source: STJ